quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Estávamos em 2003 e eu julgava saber tanto da vida (na verdade não sabia mesmo nada...), amava o Teatro sem igual, dizia que por ele faria tudo. Mas depois de algumas lambadas, de muitas noites sem dormir, de alguma dor, do choque com a realidade, lá me apercebi que esta vida não é só um grande amor e uma cabana.

Tinha 18 anos e estava perdida. Saída da pele de Petra von Kant acabei por ir para a universidade porque quis contrariar o futuro incerto que ali via. Quis seguir um caminho muito perto, paralelo, mas do outro lado. Não correu bem.

Tantas coisas mudaram e re-aprendi a gostar de outra coisa. Sinto-me relativamente feliz. Não nego que era outro caminho que gostava de ter seguido.

Vejo tanta gente que passou pelos mesmos sítios em que me tornei menina-mulher e pergunto-me se apesar de terem continuado estão realmente felizes. Pergunto-me se pensam no futuro. Se fazem descontos dos recibos verdes que passam. Se têm dinheiro para as coisas que gostam de fazer. Se têm oportunidade de viajar ou se estão sempre à espera da próxima oportunidade que não chega. Se têm horários. Se têm (simplesmente) dinheiro para comer (e eu sei que às vezes não têm...).

Admiro muito quem consegue viver na incerteza de uma carreira, que depois de um projecto não sabe que outro virá e quando virá. Nem todos têm a oportunidade de carreiras brilhantes e bem remuneradas. Admiro quem fez sacrificios, pediu empréstimos e comeu arroz branco porque o dinheiro não chegava para mais para poder estudar Teatro no estrangeiro.

Eu já não sou assim. Não consigo. Cresci e comecei a ter outro tipo de ambições. Hoje, era incapaz de viver nas incertezas que vivi durante alguns anos, a gastar tempo em castings e em projectos que apesar de experiência não me deram a ver a cor do dinheiro.

Não me digam para não viajar, para não ir jantar fora, para não comprar livros e sapatos por amor à arte. Isso não é amor. Viver mal por amor, não fazer outras coisas que também se gosta por amor, é uma forma de nos magoar-mos ainda mais, de guardar-mos rancores, ódios. E tanta gente que não se curou... Que em vez de amor, agora não passa de uma amargura antiga.

Vivo com o "bichinho" dentro de mim, adoro o Teatro, mas também já lhe guardei algum ódio. Acho que me curei.

Já não sofro quando entro numa sala de teatro, mas ainda me custa, e irá sempre custar.

Sem comentários: